Clichês da vida







"Se algo é bom demais para ser verdade, pode apostar que não é".

Coisas de Woody








Que filmes correm o risco de utilizar muitos clichês é um fato comprovado em algumas histórias. Agora a vida também não escapa destes clichês, porém fingimos não enxergar, ou no máximo, lidamos com o melhor senso de humor possível na tentativa de encarar a vida de maneira mais surpreendente.

Em Para Roma com Amor (To Rome with Love, 2012) Woody Allen faz algo incrível com estes clichês, leva para a tela na bela Roma e de certa forma tudo vira uma brincadeira brilhante, com tom cômico, irônico e crítico. Antes de qualquer expectativa é preciso desarmar  de uma - não tente comparar com Meia-Noite em Paris (Midnight in Paris, 2011)pois apesar de o diretor e roteirista ser o mesmo, a cidade não é! E o roteiro de Para Roma com Amor é uma adaptação livre da trama Decamerão (de Giovanni Boccaccio 1348 - 1353), contrariando a proposta de Meia-Noite em Paris que ganhou Oscar por roteiro original. 

Outro importante diferencial entre os dois filmes é que enquanto Woody, em Paris, caprichou no conhecimento cultural - exigindo o mesmo dos espectadores para que o filme fizesse mais sentido, e as piadas fossem mais engraçadas -, em Roma, Woody pega mais leve e resolve se voltar, como já disse, para os clichês da vida.

Todavia, esta decisão não desqualificou o filme, pelo contrário, lhe deu outro valor. Os quatro segmentos desencontrados, possuem histórias contadas por um guarda de trânsito, ele afirma ser grande admirador da vida - esta foi, talvez, uma das homenagens feitas por Woody Allen à Fellini, a outra mais clara, foi acrescentar na história um casal, do interior, recém-casado que resolve se aventurar na cidade grande.

Eu poderia gastar tempo em apresentar os personagens, mas deixarei para conhecerem 'pessoalmente'. Contudo vale discutir o mundo apresentado em Roma, através destas histórias. Não se trata apenas da bela vista turística e fotografia proposital para nos dar vontade de pegar um voo para Roma, como muitos discutiram, mas retornar aos clichês tão comentados.

A fama, de onde vem? Para onde vai? Quem faz? Será este um dos jogos mais divertidos e críticos, em uma realidade de ilusão surgida no despertar do relógio, jornalistas mostram como podem ser excessivos em suas coberturas e furos jornalísticos, como podem ser 'bobos' em suas perguntas e como o mundo das celebridades é passageiro e nada compreensível. (Roberto Benigni está demais na pele de Leopoldo, mas neste caso sou suspeita por ter sido visgada pelo seu carisma em A vida é bela)

O surgimento do romance entre uma turista estadunidense e um italiano próximo às românticas fontes italianas, será suficiente para trazer a família capitalista dos Estados Unidos para a Europa. Com ela o encontro entre o empresário (Woody Allen está demais em um papel tão parecido consigo mesmo - à frente de seu tempo ou imbecil?!) e o cantor, mas um cantor de chuveiro! Afinal de contas, quem nunca cantou debaixo do chuveiro? Se o chuveiro é a inspiração, tudo está resolvido.

A amiga perfeitamente sexy da namorada perfeita pode causar grandes problemas! (Ellen Page conseguiu me convencer muito, saiu do papel de Juno) A velha história de a grama do vizinho ser mais verde, é suficiente para causar grandes dúvidas na cabeça, duvidar do amor por aquela que se amava tanto e até ter uma consciência um tanto quanto viva e experiente no assunto. Incrível como esta 'consciência' entende das regras dos jogo da conquista, inclusive aquelas em que todos se preparam com os assuntos principais para parecer mais inteligente do que de fato é.

E a cidade grande ainda é o quê há para pessoas do interior em busca de sonhos (aparentemente) impossíveis de serem vividos em pequenas vilas. A expectativa do que a grande cidade pode oferecer se mistura com suas tentações e desejos não permitidos no interior - estes vão desde uma solicitada prostituta (a fantástica Penélope Cruz) e a eterna paixão por um astro de cinema (não tão bonito, mas astro). Mais ilusões necessárias na vida para o amadurecimento e compreensão de como a riqueza pode estar na simplicidade da vida.

Discorrendo sobre assuntos tão batidos, Woody Allen consegue ser profundo ao mostrar como tudo passa e a importância de se viver a vida, e claro, ainda em ritmo de recesso econômico, o diretor (ator e roteirista) estadunidense fez questão de mostrar que vale reforçar: dinheiro não é o mais importante.

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