“De água e luz ele faz seu esplendor...”, quem é ele?! Na crônica “O Pavão” de Rubem Braga são as plumas de um pavão, contudo, também pode se tratar de um grande artista. Braga vê nas crônicas a essência para apresentar a simplicidade com um pouco mais de poesia artística. Isto porque esta simplicidade diária pode não atrair de imediato, já que a fadiga da rotina impede de ser admirada. É preciso muita sensibilidade para captar a beleza dos comportamentos diários, observar grandeza nas pequenas coisas.
Esse cuidado com os pequenos detalhes é muito bem representado em “Aula de Inglês”, a história é sobre um garoto e sua aula de inglês, mas o cronista se aprofunda neste aprendizado. Não se trata apenas de memorizar o novo idioma, o garoto se envolve mais com a língua, por exemplo, quando questionado “Is this an elephant?” – o guri avalia verdadeiramente a imagem e tira algumas conclusões, anteriores a resposta final, típicas de uma criança - “e mesmo que morra em consequência da brutal operação, continua a ser um elefante; continua, pois um elefante morto é, em princípio, tão elefante como qualquer outro”.
Mesmo vivendo mais tempo em terras urbanas, Braga faz questão de mostrar sua ligação com a natureza, tenta, desesperadamente e poeticamente, mostrar a importância da natureza - antes que o progresso a engula e tire toda a sua glória. Faz questão de mostrar o quão solitária é a vida na cidade grande, talvez, reflita um pouco de sua própria vida, já que saiu do interior do Espírito Santo rumo à metrópole.
Essa sensibilidade com a natureza é repassada para seu estilo de escrita, uma escrita mais lenta, isto é, com muitas descrições, possibilitando ao leitor a formação da imagem na cabeça. Contudo, é incrivelmente dinâmica, com textos subjetivos, epifanias, histórias sensuais, bem humoradas, além de curiosidades adicionadas.
De certa forma não deixa de refletir o comportamento social da década de 30, em que o natural e o industrial brigam por seu espaço, o calmo e o agitado. Rubem Braga propõe crônicas contraditórias bem como o próprio progresso o é; tristezas e alegrias representadas por um mesmo objeto, como é o caso da luva no texto “As luvas”. A força dos acontecimentos mesmo que passageiros, bem representado em “Visão”, onde a visão do personagem com relação ao mundo, a tudo que o rodeia é alterado quando seus olhos encontram uma mulher, mesmo que rapidamente. Afinal de contas, o novo mundo pede agilidade.
A mulher, inclusive, não é deixada de lado. Braga parece ter um especial carinho pelo sexo feminino, apresenta suas personagens de maneiras diferenciadas, seja como mulher amada e odiada, apenas como mulher desejada, ou como criança brincando inocentemente em uma praia qualquer. Também dedica um espaço para mostrar o novo comportamento feminino, a busca pela sua independência, como é o caso da personagem de “As luvas”, que nem permitiu que seu companheiro lhe levasse para casa, muito menos lhe deixou contato, apenas disse ‘Telefono’.
A riqueza das crônicas de Rubem Braga está justamente na glória cedida ao comportamento social e o olhar diferenciado com relação as transformações do cotidiano, banalizadas por olhares menos artísticos e mais entediados com o dia a dia.
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