Brasil: o país do suco natural e do suco de caixinha


Sr. Antônio adora tomar um suco de laranja no seu desjejum, para isso acorda mais cedo, pega suas lindas laranjas – compradas na feira de quinta –, espreme cuidadosamente, coloca no copo, sem coar – gosta dos gominhos e do frescor da fruta. Já sua neta Gabriela não tem tempo a perder, mora no centro de São Paulo e está sempre atrasada, prefere pegar sua caixinha de suco de laranja – com gominhos – e correr para não perder o ônibus.

Na casa de Joana a comida é balanceada, sempre tem saladas e sucos variados, arroz, feijão e mistura, cada dia um tipo. A salada foi comprada no hortifrutti, são selecionadas; apesar de mais caras, ela acha que vale a pena, diz nem precisar lavar todas. Ganha tempo. O feijão é da caixinha, tem gosto de feito na hora e ganha mais tempo. O arroz ainda é feito à moda antiga, mas isso é rápido. O suco variado fica na geladeira; tem de manga, salada de frutas, morango, laranja, maça, pera e abacaxi. Nada de sujar liquidificador – é perda de tempo.

Tiago ainda esta no colégio, mas já entendeu bem que seu país foi descoberto e explorado pelos portugueses. Muito pau-brasil, cana-de-açúcar, grãos, frutas foram retirados daqui e enviados para a Europa. Por alguma razão, todas essas questões lhe foram repassadas de maneira tão negativa que essa história de ser um país agrícola nunca lhe soou muito bem.

Assistindo mais uma dessas aulas de exploração, Tiago decidiu: não comeria nada natural, apenas comidas industrializadas. Não queria ser ele o explorador de sua própria terra. E odiava quando encontrava pessoas – de fora do país –, em suas conversas on-line,que diziam no Brasil só existir mato, macaco e salada de frutas.

Os quatro personagens desta história vivem em um país dito, durante muito tempo, como atrasado por ter mais força agrícola do que tecnológica. Alguns até espalham por aí ser ruim para nossa imagem essa história de plantar, nada legal para a identidade brasileira, fortalece o estereótipo. Como se fôssemos eternamente o quintal de plantação dos modernizados.

É bem verdade que o Brasil continua sendo um grande exportador de bens agrícolas.O agronegócio brasileiro vai de vento em popa, obrigada. Só no mês de novembro de 2011,obtivemos a soma de US$ 455 milhões nas exportações de bens como soja em grão, algodão em estado bruto, fumo em folhas, carne de frango, bovina e suína, café em grão e minério de ferro . Enquanto o mundo tremia e caía na crise de 2008, o agronegócio brasileiro foi o mercado que menos sofreu, além de ter obtido uma recuperação positiva e alcançado números recordes nas exportações; em 2010, o crescimento foi de 16,4% em relação ao ano anterior – 2009 ainda era um ano crítico.

Apesar do Brasil possuir muitos importadores europeus – como na época da colonização –, o país tem investido e mostrado como o agronegócio é algo sério e de grande valor. Não à toa, ao conhecer de perto esta "indústria rural" é possível observar como de atrasada não tem nada; pelo contrário, a tecnologia aplicada à produção de tanta comida é apenas a prova do quanto o rural anda avançando e deixando muita cidade para trás.

A laranja de Sr.Antônio dá emprego em pequenas fazendas, mas, para virar o suco de sua neta Gabriela, pode gerar mais do que apenas a bebida refrescante. Vira comida para gado leiteiro (o bagaço da laranja), efluente tratado (água da laranja), óleo e inseticida de mosquito (retirado da casca) e até os gominhos, tão admirados pelo Sr.Antônio, podem ser vendidos separadamente.

Não apenas a fábrica do suco de laranja possui tamanha tecnologia com apenas um fruto, outras variações como o café, a cana-de-açúcar, a indústria farmacêutica – para a manutenção de tanto "mato e bicho" espalhadospor tantas fazendas brasileiras– também têm atingido um nível plausível em tecnologia.

Tiago não devia se envergonhar, contudo observar o quanto o agronegócio é bom para o seu país e sua grande participação também na produção dos produtos industriais que ele resolveu consumir. A variação na mesa de Joana apenas ratificacomo a mão brasileira aprimorou sua relação com a terra, investindo continuamente em um mercado notadamente importante para o PIB (Produto Interno Bruto) nacional – segundo o Cepea(Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada),o PIB agrícola de 2010, no PIB total, foi de 22,34%.

O Brasil não deve ser visto apenas como o país da exploração de "matéria-prima", contudo ser compreendido como aquele que tem conseguido aliar, na medida do possível, o ontem e o hoje, tecnologia e natureza, construindo uma identidade mais completa em que é possível se orgulhar de suas feiras de rua ricas de frutas, verduras, legumes e seus mercados ricos de café, molho de tomate, sucos, arroz e feijão.

Matéria para publicação na Revista Paradoxos

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